“Onde estiver o teu tesouro estará também o teu coração”
Essa advertência bíblica deveria pautar o debate sobre o Fundo Partidário, criado para sustentar os partidos políticos, assim como o caixa dois passou a existir para pagar as campanhas eleitorais, que causam vergonha ou medo aos financiadores. Passou a ser assim, porque a política deixou de apaixonar para ser uma atividade quase criminosa e sem sentido, sendo esta última característica a razão para a fuga das mulheres, que são bem mais pragmáticas que nós homens.
A última eleição é um alento para quem gostaria de ver a política com o perfil de outros tempos. Sim, porque houve época, não muito distante, em que os partidos e a política eram sustentados pelos militantes. Eu me lembro desse tempo.
Em 1982, vim de Brasília, minha residência naquele tempo, para organizar um partido e algumas campanhas no Rio de Janeiro. Cheguei à sede do PFL, na Almirante Barroso, no Centro do Rio, e encontrei um oficial de justiça com um comunicado judicial de obrigação de pagamento em sete dias, dos seis meses de aluguéis atrasados, sob pena de despejo logo em seguida.
Resolvi o problema em cinco dias, com uma campanha relâmpago de arrecadação que animou 816 filiados. Logo depois, providenciei a mudança de endereço para um local mais barato, cumprindo a promessa que fiz na campanha de arrecadação. A paixão dos militantes enchia os auditórios das convenções e eventos, sempre financiados com o dinheiro dos filiados. O débito em conta de mensalidades para o partido era um procedimento de rotina.
A contribuição de pessoas jurídicas era proibida como hoje é. Quando a paixão desapareceu, criou-se, primeiro, a contribuição de pessoas jurídicas e fez-se a ligação entre o financiamento das campanhas e os interesses comerciais das empresas financiadoras. Surgiu o caixa dois, porque, como em pauta estavam os interesses, era preciso preservá-los independente dos resultados de cada eleição. Misturou-se a política com os interesses comerciais, a corrupção cresceu e, para escondê-la. surgiu o Fundo Partidário.
“Misturou-se a política com os interesses comerciais, a corrupção cresceu e, para escondê-la. surgiu o Fundo Partidário.”
Ao que parece, o povo cansou de tudo isso e começou a promover mudanças. A paixão volta devagar, numa situação que os desavisados chamam de radicalização.
Bill Clinton, ex-presidente dos Estados Unidos, na autobiografia “Minha Vida”, avisa: “As campanhas presidenciais bem sucedidas exigem três pontos básicos. Primeiro, as pessoas têm de ser capazes de olhar para você e imaginá-lo presidente. Depois, você precisa ter dinheiro e apoio suficientes para se tornar conhecido. Depois disso é uma batalha de ideias, mensagens e questões”.
Nos Estados Unidos, a primeira batalha é pelo financiamento. O candidato que mais arrecada mostra que é capaz de apaixonar, de fazer com que o dinheiro caminhe na direção do coração.
Sei não, mas me parece, ao olhar as últimas eleições, que algo positivo começar a acontecer por aqui. Já tem partido que entendeu que o Fundo Partidário não é bom negócio, porque não qualifica o voto. Quem sabe, não voltará a velha política, aquela em que contribui quem acredita?
*Artigo publicado no Boletim da Liberdade.
Por Jackson Vasconcelos