“Pela memória do Coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, o pavor de Dilma Rousseff!” Com essa frase, em 2016, Jair Bolsonaro, já candidato à presidência, declarou o voto dele a favor do impeachment da Presidente Dilma.
Com a frase e com o voto, Jair Bolsonaro reacendeu, na memória do povo brasileiro, o golpe de 1964, momento em que o Congresso Nacional declarou vaga a Presidência da República, tendo-se, ainda, em exercício pleno, legal e legítimo, o Presidente João Goulart. Os generais apoiaram a decisão do Congresso, mas exigiram, em troca, a Presidência da República e todo o poder que ela pode representar para os ditadores.
Não existe na história recente do Brasil, além do Coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, alguém que represente com mais propriedade o período de terror iniciado no Brasil em 1964, uma longa noite de prisões, mortes, desaparecimentos, torturas, exílios, mandatos cassados, perseguições e aposentadorias compulsórias cruéis. Portanto, ao homenagear o Coronel Ustra Jair Bolsonaro, no imaginário dos críticos e das vítimas de 64, assumiu a imagem de alguém favorável ao golpe de 64 e de todas as consequências dele.
Depois, houve uma sequência de fatos que reforçaram a imagem de apoio do Presidente ao golpe de 1964 e à preferência por ditadores. Por exemplo, a nomeação de militares para os postos-chaves do governo, inclusive para o papel de interface com o Congresso Nacional e com a imprensa. Na mesma direção, caminhou a declaração de Jair Bolsonaro no dia 31 de março de 2020, quando ele se referiu ao golpe de 64 como o “Grande dia da liberdade”. Em agosto de 2021, Jair Bolsonaro autorizou o desfile de tanques nas ruas de Brasília, com o pretexto de homenagear a Marinha, um fato que a imprensa vendeu como uma tentativa de constranger o Congresso Nacional, que votava a exigência de voto impresso nas eleições.
A presença e pressão dos apoiadores de Jair Bolsonaro nos portões dos quartéis do Exército foi a pincelada final na composição da imagem negativa dele. O fato reacendeu a lembrança da ocasião em que o povo brasileiro foi às ruas em 1964, para pedir a intervenção dos militares no processo político.
Jair Bolsonaro, por atos, fatos e palavras, vestiu a imagem de ditador e de golpista, algo que ele mesmo reconhece ter, embora não queira. Por isso, ele cita, com frequência cansativa, a decisão de manter-se dentro das “quatro linhas da Constituição Brasileira”.
Luigi Pirandello, Nobel de Literatura em 1934, escreveu “Assim é (se lhe parece)”, uma peça que cabe na política brasileira nesta altura, quando se vive uma verdadeira esculhambação sobre o conceito de verdade. O que é ou não é realidade? O que é ou não é só imagem? O que é verdade ou narrativa? Pirandello traz na peça a compreensão de que há sempre, naquilo que a gente toma como verdade, um elemento de relatividade baseado na consciência subjetiva.
Bolsonaro é ou não um golpista? Será que assim é se lhe parece ser?