Jackson. 5 de outubro de 2024
Há quem queira uma nova Constituição por acreditar que desse modo impedirá decisões dos ministros do STF julgadas por muitos como inconstitucionais. Há quem defenda uma nova Carta por outros motivos. Se satisfeita a vontade, teremos a oitava Constituição. A primeira foi feita há 200 anos, em 1824 e a última, ainda em vigor, está com apenas 36 anos de idade.
Do que sei, essa última foi a única a contar com a participação do povo desde a escolha dos constituintes por eleição direta. O povo esteve presente nos corredores e galerias do Congresso Nacional durante todo o tempo da elaboração da Carta. Pessoas de todos os lugares do Brasil chegaram a Brasília. Gente de todas as etnias, religiões, sexo, escolaridade, padrão de vida. Pessoas com deficiência. Pessoas com emprego e pessoas sem emprego. Quem não conseguiu ir a Brasília participou de fóruns, debates e conversas com os parlamentares e jornalistas.
A elite acomodou-se. Depois, resolveu adaptar o documento aos seus interesses e hoje a Carta já tem mais de 200 emendas promulgadas e sabe-se que há um número maior ainda de propostas nos escaninhos do Congresso Nacional aguardando deliberação.
Insatisfeita, a elite faz e refaz leis; faz, refaz e emenda constituições; depõe e coloca presidentes, instala ditadura e até muda regimes, como aconteceu em 1889, quando proclamou a República com o intuito de livrar-se do risco de ter um terceiro reinado com Isabel, autora da Lei Áurea, decisão contrária à vontade da elite brasileira.
Encontrei no livro “Campos Sales. Da Propaganda à Presidência” o relato sobre todo o movimento que levou o Brasil da Monarquia à República:
“Aumentavam-lhe a probabilidade de uma próxima vitória definitiva…” pela instauração da República…”O Imperador tinha-se descuidado negligentemente de preparar o espírito da princesa Isabel, dando-lhe uma educação cívica mais compatível com as altas funções de imperante, que o direito de sucessão lhe havia destinado…”
Em outra passagem, relata Campos Sales:
“O Sr. Saraiva, na sua conferência de Petrópolis, adiantara ao Imperador este parecer: O que Vossa Majestade deve fazer ao findar este reinado é entregar à nação a coroa que ela deu a V.M. em 1831.”
- Mas, minha filha?
- A princesa é muito religiosa, segundo se diz, e deve resignar-se.”
Sérgio Buarque de Holanda numa das entrevistas que concedeu à revista VEJA, publicada nas Páginas Amarelas no dia 28 de janeiro de 1976, com o título “A DEMOCRACIA É DIFÍCIL”, afirmou: “No Brasil sempre foi uma camada miúda e muito exígua que decidiu. O povo sempre está inteiramente fora disso. As lutas, as mudanças são executadas por essa elite e em benefício dela, é óbvio. A grande massa navega adormecida, num estado letárgico.(…). Até agora, todas as revoluções dentro da história do Brasil foram de elites, civis ou militares, mas sempre elites…”
Vilfredo Pareto definiu a elite na obra Trattato di Sociologia generale, publicada em 1916: “A teoria da elite ou classe eleita foi elaborada por Vilfredo Pareto e consiste na tese de que uma pequena maioria de pessoas é a que conta em todo ramo ou campo de atividade e que, mesmo em política, é uma tal minoria que decide sobre os problemas do governo. Essa teoria foi um dos pontos fundamentais da doutrina política do fascismo e do nazismo” (Dicionário de Filosofia. N. Abbagnano).
Se queremos uma nova Constituição para o Brasil, que tal tentarmos viver uma segunda vez a experiência de 1988, trazendo o povo para a conversa? Nem que seja só para ela dizer se aceita as mudanças que a elite tem feito no tratado combinado em 05 de outubro de 1988.